Pará

Jamaraquá | Entre o Tapajós e a Floresta Amazônica

15 dez 2014

Nossa primeira noite em Jamaraquá, à beira do Tapajós,foi uma bela introdução à vida real na Amazônia. Havia brisa escapando pelas frestas, insetos na parede, sons estranhos. Uma situação atípica e até um pouco assustadora pra quem está acostumada à vida na cidade.

GUACHO JAMARAQUÁ Com a luz do dia, os riscos voltaram ao tamanho que realmente tinham, ou seja, quase nenhum. O único barulho era o dos guachos preparando seus ninhos descabelados.

Dormimos na beira do rio mesmo, só não foi dentro d’água porque estamos em época de seca na Amazônia. Nesta época, o rio encolhe vários metros, deixando a nossa palafita no alto, sobre suas pernas finas.

POUSADA DO SEO PEDROPalafita? Sim, porque aqui na várzea as casas ou boiam, amarradas nas margens, ou se elevam além da oscilação sazonal do rio. Nossa pousada, uma palafita feita por seo Pedro com as próprias mãos, parece frágil com suas paredes de madeira e seu telhado de palha. Mas foi feita para resistir a tudo.

Seo Pedro mora ali pertinho, já em terra firme. Uma boa alternativa principalmente por questões sanitárias. No local também estão instalados os banheiros da pousada.

Casa JamaraquáA casa é também coberta de palha, a melhor opção para manter o frescor do ambiente sob o sol do Equador, e tem as paredes literalmente abertas para o mundo.

Dona Conce, como é conhecida a mulher do seo Pedro, não tem dia, nem horário. Recebe os turistas, muitos estrangeiros, com um baita sorriso e um prato cheiroso de tambaqui assado. Na mesa, há sempre uma garrafinha de tucupi, caldo feito a partir da fermentação da mandioca brava, com tempero de pimenta de cheiro.

Dona Conce Dona Conce cresceu aqui em Jamaraquá, uma das 22 comunidades tradicionais dentro da Floresta Nacional do Tapajós, na margem direita do rio. A história oral conta que um português avó dela foi um dos primeiros moradores. Ele chegou, casou-se com uma índia do Tapajós e ficou.

Ela ainda tem na memória tempos bem mais difíceis. Quando, a menos de 80 km de Santarém, uma das maiores cidades do Pará, as crianças morriam de diarreia e os adultos sobreviviam a duras penas.

Placa Flona Tapajós A Floresta Nacional do Tapajós foi criada em 1974 apenas como reserva de madeira. No papel, seria um lugar de árvores, sem pessoas. As comunidades antigas deveriam simplesmente deixar suas casas e abandonar a floresta.

Durante 20 anos, os moradores resistiram. Chegaram a montar trincheiras de resistência, com vigilância constante para evitar a remoção.

Finalmente, em 1994, um decreto federal permitiu a permanência das comunidades tradicionais na área de conservação. Aos poucos, os moradores ganhavam voz.

Depois de um longo processo de estudos ambientais e discussões entre Ibama e moradores, o plano de manejo foi criado em 2004. Ele prevê a participação na comunidade na organização, no uso sustentável dos recursos e na preservação da floresta.

Com o projeto de ecoturismo comunitário em andamento, Dona Conce virou referência entre as 24 famílias do lugar. É uma mulher multitarefa. Atende o celular enquanto faz a tapioca do nosso café-da-manhã. E abre o caderninho para selecionar o guia da vez entre os moradores treinados para conduzir os turistas pelas trilhas da Floresta Nacional do Tapajós.

Seo Pedro em Jamaraquá Hoje é dia de muito trabalho para receber um grupo grande de visitantes que veio de Santarém de barco para o almoço.

Nossa pousada vira restaurante, seo Pedro a servir de sobremesa as fatias gordas do caju colhido há pouco. Ah, os cajueiros de Jamaraquá! Confesso que, pela primeira vez, caju pra mim não significou simplesmente a castanha. Experimentei a fruta no pé, vermelhíssima, no ponto exato da doçura…

Caju Pará O grupo de turistas sobe o rio e nós partimos para o melhor programa por aqui, mergulhar nas águas mornas do Tapajós e caminhar pelos bancos de areia cercados por toda aquela transparência azul-esverdeada.

Depois, embarcamos na grande instituição amazônica: a REDE.

Banco de areia Tapajós Tapajós alaranjadoDo alto de nossa pousada-palafita, agora nosso refúgio seguro, vejo o Tapajós mudar de cor. Do azul brilhante, vai se alaranjando, avermelhando. Quando o sol toca o horizonte, encontra um mar de água cor de prata. Os pescadores retornam, a comunidade segue sua vida tranquila. Para onde quer que você aponte a câmera, sai uma foto de cartão postal.

Pescador Jamaraquá Tapajós espelhado
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Jamaraquá – Floresta Nacional do Tapajós | Informações Importantes

Como ir a Jamaraquá

A porta de entrada para a Floresta Nacional do Tapajós é a cidade de Santarém, a uma hora de voo de Belém ou Manaus. De barco, a partir das duas capitais, a viagem a Santarém dura dois ou três dias pelo Rio Amazonas.

De Santarém, chega-se à Flona Tapajós e à comunidade de Jamaraquá por água ou por terra.

Se for alugar um carro, faça a reserva com antecedência. Em feriados e finais de semana, a procura é grande. O trajeto mais rápido é pela BR -163, no trecho asfaltado da rodovia Cuiabá- Santarém. São 47 km até a estrada 7, também asfaltada, que leva à cidade de Belterra. Dalí , mais 14km pela Transtapajós, uma estrada de terra bem conservada. A viagem leva no máximo uma hora e meia.

Trantapajós com mata postOutra opção, se estiver de carro, é seguir de Santarém direto para a vila de Alter do Chão e de lá seguir pela Transtapajós. Contei como ir até a Floresta Nacional do Tapajós por este caminho aqui. Existem linhas de ônibus diárias para Jamaraquá. Saem normalmente às 11h em frente ao Colégio Santa Clara, na Avenida São Sebastião, em Santarém. O ônibus retorna às 5 da manhã da comunidade.

Várias agências e barqueiros fazem o percurso pelo Rio Tapajós a partir de Santarém ou de Alter do Chão. Na orla de Alter, procure os barqueiros da Associação de Turismo Fluvial. Os preços são mais baixos e você pode combinar os horários de ida e retorno. O percurso de lancha leva uma hora. Em barcos maiores, são três horas de viagem.

Onde ficar

QUARTO POUSADA JAMARAQUÁ

Nos hospedamos na pousada Nirvana do Tajapós, conhecida simplesmente como a pousada do Seo Pedro, uma das mais antigas do Flora.
Você pode fazer a reserva direto com ele pelo celular: (93) 99124 5750.

O que fazer

A grande atrativo é conhecer a floresta a partir de uma comunidade tradicional que vive há gerações entre a mata e o rio.

Artesãs de Jamaraquá

Artesãs de Jamaraquá

Os moradores de Jamaraquá foram treinados para conduzir visitantes em passeios de barco nos igarapés e pelas trilhas na Floresta Nacional do Tapajós .

Produtos Jamaraquá A comunidade tem também uma loja para venda dos produtos artesanais feitos com sementes e latex da floresta. Um bom lugar para comprar lembranças de viagem e, ao mesmo tempo, ajudar a manter o programa de turismo comunitário. Os visitantes também podem conhecer a coleta e o beneficiamento do látex.

Reserve tempo para conviver com os moradores e simplesmente aproveitar as belas praias do Rio Tapajós.

Quando Ir

As praias do Tapajós aparecem no período de seca, normalmente entre julho e dezembro. No período de rio cheio, no primeiro semestre, não há praia mas você ainda pode percorrer as trilhas na Floresta e passear de canoa pelos igarapés.

Fique de olho

O turismo aqui tem bases comunitárias e segue as regras de preservação da floresta e dos costumes dos moradores.

Não é permitido caçar ou manter animais silvestres em cativeiro. Por isso, você só vai vê-los livres na floresta, com orientação dos guias.

Também não é permitido tirar plantas da floresta sem autorização, ouvir som alto ou andar de carro pela praia.

A alimentação e a hospedagem dos visitantes seguem também o estilo de vida local. Peixes e galinha caipira estão sempre no cardápio, comida simples e gostosa.

Lembre-se que o banheiro fica fora da pousada. É perto, ao lado da casa de Seo Pedro e dona Conce. Leve produtos de higiene, toalhas e lençóis.

Você encontra mais informações na página do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, que gerencia a unidade de conservação onde fica o Jamaraquá: www.icmbio.gov.br/flonatapajos.

Fotos: Cassiana Pizaia

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Mais informações e dicas sobre turismo em Alter do Chão e Jamaraquá?

Dê uma olhada nos outros posts do blog sobre a região:

Alter do Chão: Praias, passeios, quando ir, como chegar

Na Trilha pela Floresta Nacional do Tapajós
A caminho da Floresta Nacional do Tapajós
De Alter do Chão às surpresas do Canal do Jari

por Cassiana Pizaia
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comentários

  1. Renata Matoso
    15 dez 2014

    Nossa a delicadeza dos detalhes faz o encantamento ficar ainda maior. .
    Já me vejo vidrada nesses artesanatos..

    • Cassiana Pizaia
      16 dez 2014

      A lojinha da comunidade é uma graça, Renata. E as peças são embaladas em papel personalizado com a marca de Jamaraquá. Ótimas lembranças!

  2. Eu nunca havia escutado falar neste lugar! Como o Brasil é grande, que destino maravilhoso… Obrigada pelo relato! Sensacional!

    • Cassiana Pizaia
      12 jan 2015

      O norte do país ainda é pouco conhecido por nós brasileiros, Silvia. E é uma região de uma riqueza natural e cultural impressionante. Vale a pena colocar no roteiro

  3. Fábio Rebelo
    26 set 2015

    Parabéns pelo post. Belas imagens e informações úteis aos iniciantes nas veredas amazônicas. Saudações caboclas.

    • Cassiana Pizaia
      28 set 2015

      Obrigada, Fábio. Já estou planejando minha volta. Saudações caboclas pra você também! 🙂

  4. Manoel
    18 nov 2015

    É preciso de permissão do ICmBio para chegar em Jamaraquá?

    • Cassiana Pizaia
      19 nov 2015

      Precisa sim, Manoel. Mas é bem fácil conseguir. O ICMBIO tem escritório em Santarém mas o mais prático é pegar a entrada/autorização no posto que fica na estrada para a Floresta Nacional do Tapajós, na Comunidade de São Domingos, pouco antes de Jamaraquá. Boa viagem!

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